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Mickey entrou em domínio público, e agora?

por | 22/01/2024 | Artigos, Marcas

A advogada Fernanda Vieira explica como funcionam os direitos autorais neste caso.

O ano começou (inclusive, feliz ano novo, caros leitores) trazendo consigo algumas polêmicas, como o caso da primeira versão do personagem Mickey estar oficialmente em domínio público. Propriedade da Disney até então, são muitas as perguntas que as pessoas têm feito sobre essa mudança e seus impactos.

Amantes da Disney que somos (e aqui, eu advogo em causa própria também), conversamos com a advogada Fernanda Vieira, sócia da Daniel Advogados e especialista no assunto, para esclarecer as consequências desse caso para os consumidores, artistas e, é claro, para a própria Disney.

O que é domínio público?
Esse é um termo utilizado no âmbito jurídico para se referir a todo tipo de obra intelectual, como livros, músicas, criações científicas e personagens, que deixa de ser protegida pela lei de direitos autorais.
“Isso é patrimônio público, assim como um banco de praça onde qualquer um pode sentar, qualquer um pode utilizar esse conteúdo para criar em cima disso. A lógica é que, após anos de exclusividade, isso se torna algo de propriedade da sociedade, podendo ser utilizado livremente”, explica Fernanda.

O domínio público abrange diversas circunstâncias que variam de acordo com a legislação de cada país, mas comumente acontecem após o falecimento do autor original. Se ele deixar sucessores, a lei determina um período específico para que esse material não possa ser reproduzido sem autorização. No Brasil, esse período é de 70 anos, mas nos Estados Unidos, país onde o Mickey foi criado, são 95 anos! Esse prazo é contabilizado a partir do primeiro dia do ano seguinte ao do falecimento do autor da obra.
Em contrapartida, caso o dono original não tenha sucessores ou seja uma pessoa desconhecida (uma pessoa não-pública), o material entra em domínio público a partir da data de falecimento dele.

Onde o Mickey entra nessa história?
Quando a notícia veio a público, muitos internautas ficaram em dúvida sobre qual ou quais versões do Mickey a legislação estaria abrangendo. Isso se deve ao fato de que, ao longo de 95 anos, o ratinho da Disney passou por diversas reformulações e atualizações.

A versão que entrou em domínio público foi a primeira, de 1929. Para os fãs atuais da Disney, que podem não se recordar de qual versão é essa, trata-se da que costuma aparecer nas aberturas dos filmes animados da empresa. Essa versão apresenta o adorável Mickey desenhado pelo próprio Walt Disney, dançando e assobiando no curta-metragem ‘Barco a vapor Willie’.

Confira o curta abaixo:


Afinal, domínio público é algo bom ou ruim?

Outra dúvida comum entre quem navega diariamente nas redes sociais é essa. Logo após a entrada do Mickey nesta categoria, foram anunciados um filme e um jogo, ambos de terror, baseados no mascote da Disney. Enquanto, para alguns, isso se trata de um desrespeito à imagem do personagem e deveria ser limitado, para outros, é importante que as pessoas tenham liberdade criativa para explorar esse produto da forma que quiserem.

“A legislação brasileira é muito preocupada com os direitos morais e com a personalidade do autor que, mesmo depois de falecido, tem sua memória preservada. Aqui (no Brasil) existe o direito à integridade, que proíbe o uso de obras em domínio público para ferir a honra e reputação do autor. Nesse sentido, nos Estados Unidos é mais livre, já que não há a preocupação com a honra do autor original, sendo um espaço aberto para a criação”, comenta Fernanda.

Do ponto de vista criativo, a utilização de um material para gerar novos conteúdos não representa um problema, pelo contrário. É importante para permitir que a arte possa se renovar com base em conceitos éticos. A criação de um novo material, independentemente de sua origem, não altera a moral estabelecida na obra original que, neste caso, foi imortalizada há 95 anos.

Para comprovar este ponto, a arte de capa desta matéria, feita para captar a atenção dos leitores e agregar ao conteúdo escrito ao representar a passagem de tempo do primeiro rascunho do Mickey até o que conhecemos atualmente, só pôde ser feita a partir do momento que essa versão do personagem entrou em domínio público. Sendo assim, a existência da legislação que respalda e respeita o autor é importante e necessária, mas abrir portas para que outras mentes possam agregar ao que foi feito não prejudica, mas colabora para o fortalecimento da imagem da obra original.

A sócia da Daniel Advogados compartilha de uma visão semelhante. Segundo ela, “como advogada, creio que eu poderia ter mais argumentos contra esses eventuais projetos de terror do Mickey. Porém, mesmo assim, seria um caso difícil, porque se trata de colocar mais obstáculos para barrar a livre criação em cima de uma obra que ficou protegida durante muito tempo”.

 

Matéria publicada no portal Adnews.

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