NOTÍCIAS E PUBLICAÇÕES

Moderação de conteúdo na rede e propriedade intelectual

por | 03/10/2023 | Artigos, Jurídico

Considerando as urgências relacionadas ao uso da internet e democracia, muito tem se falado sobre moderação de conteúdo sobre desinformação na rede. No entanto, o tema moderação é bem amplo e atinge outros setores da sociedade, principalmente quando se trata de propriedade intelectual.

Não é de hoje que se discute a interação entre propriedade intelectual e tecnologia, principalmente quando se fala em internet. Como este viabiliza o compartilhamento de dados de forma facilitada, esta também se tornou um terreno fértil para o compartilhamento não autorizado de obras protegidas por direitos autorais, como músicas, livros e filmes, além de transmissões paralelas de canais fechados e jogos de futebol.

Para além dos direitos do autor, também se percebe o desenvolvimento constante do comércio online, que também se demonstrou um ambiente propício para a venda de produtos falsos. Nesse caso, chama-se a atenção para o fato de que consumidores ficam em posição de maior vulnerabilidade, já que não terão acesso ao produto físico no momento da escolha, o que acaba com a possibilidade de análise.

Nesse cenário onde é evidente a existência de violações na rede, a moderação de conteúdo surge como um assunto relevante como possibilidade de reduzir as infrações e proteger os direitos dos titulares.

Quando se fala em desinformação, o papel dos provedores de aplicações, como as redes sociais, é rapidamente questionado quando se trata dos parâmetros e limites sobre sua atuação. Quando se trata de propriedade intelectual, a situação é similar, uma vez que muitas violações também acontecem através de intermediários, a exemplo dos marketplaces.

Nos termos do Marco Civil da Internet, os provedores de aplicações não podem ser responsabilizados por conteúdos desenvolvidos por terceiros, salvo descumprimento de ordem judicial ou em casos específicos ao manter o conteúdo após ter tomado conhecimento da infração, como no caso de pornografia de revanche.

Não raro, as partes afetadas defendem uma responsabilização mais ampla dos provedores e a necessidade da elaboração de medidas mais ativas de repressão, mesmo que em dissonância com as regras estabelecidas pelo Marco Civil.

Do lado dos provedores de aplicações, ressalta-se o elevado volume de conteúdos postados todos os dias, o que praticamente inviabiliza um monitoramento ativo perfeito, dada as várias nuances entre os conteúdos postados. Logicamente, conteúdos claramente ilegais são mais facilmente identificados. Porém, em muitos outros casos, a situação é mais complexa, como é o próprio caso da venda de produtos contrafeitos, uma vez que é desproporcional esperar que todos os marketplaces sejam capazes de compreender os parâmetros de identificação de produtos falsos em relação a todos os produtos disponíveis.

A exigência de um monitoramento sofisticado também pode gerar impactos concorrenciais, uma vez que players menores no mercado podem não ter a possibilidade de dispor de custos para o desenvolvimento de tecnologias eficientes de moderação da mesma forma como operam as big techs.

No entanto, isso não significa que não haja alternativas, ou que os provedores de aplicações devam ignorar o tema.

Sabe-se que a proteção da propriedade intelectual é relevante para o desenvolvimento econômico, tecnológico e cultural e que as violações na rede geram prejuízo na ordem de bilhões de reais todos os anos. Nesse sentido, é importante a existência de medidas que tornem o ambiente online mais seguro, tanto para quem investe, quanto para quem compra.

Nesse sentido, como já é prática entre diversos provedores de aplicações, é interessante o desenvolvimento de canais para denúncias relacionadas a propriedade intelectual, bem como de ferramentas que identifiquem as violações de forma facilitada para uma posterior análise por parte dos titulares. Dessa forma, é permitido aos titulares a possibilidade de solicitar a remoção dos conteúdos indevidos sem a necessidade do ajuizamento constante de ações que, além de mais custosas ainda sobrecarregam o Poder Judiciário.

Também é importante que os titulares dos direitos de propriedade intelectual busquem assessoria especializada para lidar com o tema e atuar de forma proativa na proteção de seus direitos online, para que esta seja realizada da forma mais eficiente possível. Sobre este ponto, observa-se que é possível observar um campo no qual titulares e provedores podem atuar em conjunto para a manutenção de um mercado mais sadio.

Regularmente, se discute sobre possibilidades legislativas sobre o tema e a própria PL 2630/20, conhecida como a “PL das Fake News” traz pontos sobre direitos do autor (mas nada sobre propriedade industrial e falsificação). No entanto, este é um assunto complexo, com diversos pontos a serem considerados e sobre o qual será necessário um amplo debate até que seja desenvolvida uma solução adequada.

Finalmente, e não menos importante, destaca-se o papel do cidadão sobre o que se consome na internet. Além da necessidade de buscas por boas fontes de informação, vale o mesmo para o que se assiste e para o que se compra. A melhor alternativa é sempre buscar por canais oficiais e autorizados, garantindo a licitude da origem do que será consumido e afastando os riscos e prejuízos decorrentes das violações dos direitos de propriedade intelectual.

 

Artigo publicado no Estadão.

Artigos Relacionados

Assine nossa newsletter

Consent